Julgamento de Eichmann
Em 1960, um dos principais perpetradores do Holocausto, Adolf Eichmann, foi capturado na Argentina por agentes israelenses e levado a Israel para ser julgado.[1] Seu julgamento teve início em 11 de abril de 1961, e foi televisionado e transmitido por todo o mundo, com o objetivo de educar sobre os crimes cometidos contra judeus, que haviam sido secundários aos julgamentos de Nuremberg.[2]
O promotor e procurador-geral Gideon Hausner também tentou objetar a atuação de funcionários judeus, que surgiram nos julgamentos anteriores, mostrando-os, na pior das hipóteses, como vítimas forçadas a cumprir os decretos nazistas, minimizando a "zona cinzenta" do comportamento moralmente questionável.[3]
Hausner escreveu, posteriormente, que os documentos de arquivos disponíveis "teriam sido suficientes para condenar Eichmann mais dez vezes"; no entanto, convocou mais de 100 testemunhas, a maioria delas que nunca conheceu o réu, para fins didáticos.[4]
O advogado de defesa Robert Servatius recusou as ofertas de doze sobreviventes que concordaram em testemunhar pela defesa, contra o que consideravam comportamento imoral de outros judeus.[5]
A filósofa política Hannah Arendt relatou o julgamento em seu livro Eichmann in Jerusalem: A Report on the Banality of Evil (em português: Eichmann em Jerusalém - Um relato sobre a banalidade do mal).
Eichmann foi acusado de quinze violações da Lei (de Punição) Nazista e dos Colaboradores Nazistas.[6] Seu julgamento começou em 11 de abril de 1961, e foi presidido por três juízes: Moshe Landau, Benjamin Halevy e Yitzhak Raveh.[7]
Condenado em todas as acusações, Eichmann foi sentenciado à morte. Ele recorreu a Suprema Corte de Israel, que confirmou as condenações e a sentença. O presidente Yitzhak Ben-Zvi rejeitou o pedido de Eichmann para comutar a sentença. Na única execução judicial de Israel até hoje, Eichmann foi enforcado em 1º de junho de 1962 na prisão de Ramla.[8]
Contexto
editarDe 1933 a 1945, os judeus na Europa enfrentaram perseguição sistemática e genocídio pelos nazistas na Alemanha e seus colaboradores no Holocausto.[9] De 1941 a 1945, essa perseguição se intensificou, como parte da Solução Final, um plano para assassinar todos os judeus da Europa, que resultou na morte de cerca de seis milhões judeus.[10]
Eichmann desempenhou um papel determinante na execução do Holocausto. Depois do fim da Segunda Guerra Mundial ele fugiu para a Argentina, onde foi sequestrado por agentes israelenses da Mossad em 1960 e transportado para Jerusalém para ser julgado.[11] Eichmann foi mantido em uma delegacia de polícia fortificada em Yagur, no norte de Israel, durante nove meses antes de seu julgamento.[12]
Julgamento
editarO julgamento de Eichmann foi realizado de 11 de abril a 15 de agosto de 1961, no Beit Ha'am, um teatro comunitário estruturado para servir como um tribunal capaz de acomodar 750 observadores.[13]
Acusações
editarAs acusações de 1 a 4 foram por crimes contra o povo judeu:[14]
1. Matar judeus, através da deportação sistemática de milhões de judeus para os campos de extermínio, a partir de agosto de 1941.[15]
2. Colocar judeus em condições de vida calculadas para provocar sua destruição física, aprisionando-os em campos de concentração e extermínio.[15]
3. Causar sérios danos corporais ou mentais aos judeus.[15]
4. Impedir nascimentos de judeus, com uma ordem para abortos forçados no gueto de Theresienstadt.[15]
As acusações de 5 a 7 foram por crimes contra a humanidade contra judeus:[14]
5. Emigração forçada de judeus de março de 1938 a outubro de 1941, deportação de judeus em outubro de 1939 durante o Plano Nisko e seu papel na Solução Final.[16]
6. Perseguir judeus por motivos nacionais, religiosos ou políticos.[16]
7. A pilhagem sistemática da propriedade de milhões de judeus. O roubo de propriedade não foi enumerado na lei como um crime contra a humanidade (foi considerado um crime de guerra), mas a promotoria argumentou que se encaixava nos critérios de "qualquer outro ato desumano cometido contra qualquer população civil" conforme estipulado na lei. Como Eichmann fundou o Escritório Central para a Emigração Judaica, que confiscou a propriedade dos judeus deportados, e o tribunal determinou que o objetivo de tal confisco era em parte instilar terror e facilitar a deportação e assassinato de judeus, ele o considerou culpado nesta acusação.[17]
A acusação 8 foi por crimes de guerra, com base no papel de Eichmann na perseguição sistemática e assassinato de judeus no período da Segunda Guerra Mundial.[18]
As acusações de 9 a 12 são relacionadas a crimes contra a humanidade contra não-judeus:[14]
9. Deportações em massa de civis poloneses.[19]
10. Deportações em massa de civis eslovenos.[19]
11. Participação no genocídio cigano pela deportação forçada sistemática do povo cigano. Embora o tribunal não tenha encontrado evidências de que Eichmann sabia que as vítimas ciganas foram enviadas para campos de extermínio, ele o considerou culpado dessa acusação.[20]
12. Participação no massacre de Lídice; ele foi considerado culpado pela deportação de parte da população de Lídice, mas não pelo massacre em si.[20]
As acusações de 13 a 15 acusaram Eichmann de pertencer a organizações inimigas, respectivamente Schutzstaffel der NSDAP (SS), Sicherheitsdienst des Reichsführers-SS (SD) e Geheime Staatspolizei (Gestapo).
Ele foi considerado culpado em todas as três acusações, porque não apenas provou-se que ele era membro dessas organizações, mas que cometeu os crimes como parte de suas funções.[18]
Referências
editarCitações
editar- ↑ Bazyler & Scheppach 2012, p. 438.
- ↑ Bazyler & Scheppach 2012, p. 439.
- ↑ Porat 2019, p. 173.
- ↑ Porat 2019, p. 174.
- ↑ Porat 2019, p. 180.
- ↑ Bazyler et al. 2012, p. 443.
- ↑ Cesarani 2005, p. 255.
- ↑ Bazyler & Scheppach 2012, p. 449.
- ↑ Rogers, Alisdair; Castree, Noel; Kitchin, Rob (2013). «Holocaust». A Dictionary of Human Geography. Oxford, England: Oxford University Press. ISBN 978-0-19-175806-5
- ↑ Dear, I. C. B.; Foot, M. R. D. (2014). «Final Solution». The Oxford Companion to World War II. Oxford, England: Oxford University Press. ISBN 978-0-19-172760-3
- ↑ Dear, I. C. B.; Foot, M. R. D. (2014). «Eichmann, Adolf». The Oxford Companion to World War II. Oxford, England: Oxford University Press. ISBN 978-0-19-172760-3
- ↑ Cesarani 2005, pp. 237–240.
- ↑ Cane, Peter; Conaghan, Joanne (2009). «Eichmann, Adolf». The New Oxford Companion to Law. [S.l.]: Oxford University Press. ISBN 978-0-19-172726-9
- ↑ a b c Bazyler & Scheppach 2012, p. 443.
- ↑ a b c d Bazyler & Scheppach 2012, pp. 443–444.
- ↑ a b Bazyler & Scheppach 2012, pp. 444–445.
- ↑ Bazyler & Scheppach 2012, pp. 445–446.
- ↑ a b Bazyler & Scheppach 2012, p. 447.
- ↑ a b Bazyler & Scheppach 2012, p. 446.
- ↑ a b Bazyler & Scheppach 2012, pp. 446–447.
Bibliografia
editar- Bazyler, Michael; Scheppach, Julia (2012). «The Strange and Curious History of the Law Used to Prosecute Adolf Eichmann». Loyola of Los Angeles International and Comparative Law Review. 34 (3): 417–461. ISSN 0277-5417
- Cesarani, David (2005). Eichmann: His Life and Crimes. London, England: Vintage. ISBN 978-0-09-944844-0. OCLC 224240952
- Porat, Dan (2019). Bitter Reckoning: Israel Tries Holocaust Survivors as Nazi Collaborators (em inglês). [S.l.]: Harvard University Press. ISBN 978-0-674-24313-2
Leitura adicional
editar- Arendt, Hannah (2006). Eichmann in Jerusalem: A Report on the Banality of Evil. New York: Penguin Books. ISBN 978-0-14-303988-4
- Lipstadt, Deborah E. (2011). The Eichmann Trial. New York: Schocken Books. ISBN 978-0-8052-4260-7
- Segev, Tom (1993). The Seventh Million: The Israelis and the Holocaust. New York: Hill and Wang. ISBN 978-0-8090-8563-7
- Wittmann, ed. (2021). Eichmann Trial Reconsidered (em inglês). [S.l.]: University of Toronto Press. ISBN 978-1-4875-0849-4
- Yablonka, Hanna (2004). The State of Israel vs. Adolf Eichmann. New York: Schocken Books. ISBN 978-0-8052-4187-7
Ligações Externas
editar- O Julgamento de Adolf Eichmann: Registro dos Processos.
- O Julgamento de Eichmann, Sessão no. 46 no YouTube.
- " With Me Are Six Million Accusers " um site online que marca o 50º aniversário do Julgamento de Eichmann.
- "O Julgamento de Eichmann: 50 anos depois ": documentos selecionados dos Arquivos do Estado de Israel.
- " Entrevista do promotor de Eichmann: uma conversa com o juiz Gabriel Bach, promotor sênior no julgamento de Adolf Eichmann " por Frank Tuerkheimer, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Wisconsin (em inglês).
- "Adolf Eichmann em Israel: Retratos de um criminoso de guerra nazista", life.time.com (em inglês).
- The Devil's Confession: The Lost Eichmann Tapes - Site oficial de um documentário (em inglês)
- "Eichmann e a Consciência Privada", Martha Gellhorn, Revista The Atlantic, fevereiro de 1962 (em inglês).