Marco Valério Messala Corvino
Marco Valério Messala Corvino (64 a.C.–8 d.C.; em latim: Marcus Valerius Messalla Corvinus) foi um político gente Valéria da República Romana nomeado cônsul em 31 a.C. com Otaviano. No oriente, Marco Antônio também ostentava o título de cônsul. Foi um escritor e patrocinador da literatura romana e ficou conhecido por ser o criador do chamado "Círculo de Messala".
Marco Valério Messala Corvino | |
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Cônsul da República Romana | |
Escultura que, provavelmente, decorava a parte superior do túmulo de Corvino e que atualmente está no Museu do Prado, em Madri. | |
Consulado | 31 a.C. |
Nascimento | 64 a.C. |
Morte | 8 (71 anos) |
É comum para alguns historiadores fazer referência a Corvino e lhe atribuírem um triunfo contra os aquitanos, a vitória em Messana e o epíteto de "Corvino" quando, na verdade, estas são referências a três diferentes gerações de pessoas com este nome: Marco Valério Corvo, nascido em 370 a.C., Mânio Valério Máximo Corvino Messala, cônsul em 263 a.C., e este Marco Valério Messala, nascido em 64 a.C.. Como e onde o nome foi mudado de "Corvo" para "Corvino" é incerta. Para aumentar a confusão, Mânio é, por vezes, chamado de "Marco".[1]
Carreira
editarCorvino foi educado parcialmente em Atenas[2] juntamente com Horácio e o jovem Cícero.[3] No início de sua vida, era fascinado pelos princípios da República Romana, que ele jamais abandonou, embora, mais tarde, ele próprio tenha feito o possível para não ofender Augusto ao não mencioná-los mais de forma aberta.
No intervalo entre o assassinato de Júlio César e a formação do Segundo Triunvirato, Messala voltou à Itália.[4] Juntou-se ao partido senatorial e aproximou-se especialmente de seu líder, Caio Cássio Longino, a quem, depois, já convertido em amigo de Augusto, se referia como "meu general".[5] Foi proscrito em 43 a.C., mas, como seus parentes conseguiram provar que ele não estava em Roma na data do assassinato, os triúnviros, por conta da riqueza e da influência de Messala,[6] apagaram seu nome da lista de proscritos e lhe ofereceram proteção pessoal e para seus bens. Corvino, porém, rechaçou as ofertas e se juntou a Marco Júnio Bruto e Caio Cássio Longino na Ásia e recebeu o terceiro posto mais alto do exército republicano[7] e, na Batalha de Filipos (42 a.C.), nos combates do primeiro dia, Corvino atacou o flanco de Augusto e conseguiu invadir seu acampamento, chegando muito perto de conseguir aprisioná-lo.[8] Depois da morte de Bruto e Cássio, Messala, com um grande número de fugitivos, seguiu para a ilha de Tasos. Os republicanos, ainda que derrotados, não estavam desorganizados e lhe ofereceram o comando das forças remanescentes. Porém, ele foi convencido a aceitar as condições, bastante honradas, oferecidas por Marco Antônio,[9] de quem se tornou aliado.
Em 40 a.C., Corvino foi eleito pretor sufecto depois que todos os pretores eleitos anteriormente foram destituídos de seus cargos após o Tratado de Brundísio entre Otaviano, Marco Antônio e Lépido. No final do mesmo ano, ele e um colega, Lúcio Semprônio Atratino, convocaram o Senado para prestar homenagens a Herodes, o Grande, que recebeu o título de rei da Judeia.[10]
Quando Messala se deu conta da influência que Cleópatra exercia sobre Antônio, resolveu, pela terceira vez, trocar de lado e juntar-se à facção de Otaviano. Em 36 a.C., Corvino serviu na guerra contra Sexto Pompeu[11] comandando a frota na ausência de Marco Vipsânio Agripa. Corvino, partindo de Libo, levou três legiões até a frota de Tito Estacílio Tauro, uma preparação para a invasão da Sicília. Corvino permaneceu na Itália e deu proteção a Otaviano depois da derrota na Batalha de Tauromênio.[12] Depois da derrota de Sexto Pompeu, foi nomeado áugure.[13] Em 34 a.C., segundo Dião Cássio, participou de uma campanha contra os salassos, uma tribo alpina em revolta,[14] mas, na realidade, o responsável por este ato foi o cônsul em 30 a.C., Caio Antíscio Veto.[15]
Consulado (31 a.C.) e anos finais
editarNa Batalha de Ácio, Corvino comandou o centro da frota de Otaviano e se destacou.[16] Depois da derrota, Antônio acompanhou Otaviano até o oriente. Em Dafne, na Síria, Corvino revelou sua falta de escrúpulos ao dispersar as guarnições e gladiadores de Antônio, que aniquilou, mesmo depois de ter garantido que lhes pouparia a vida e liberdade.[17] Depois do consulado, foi procônsul da Gália Aquitânia entre 28 e 27 a.C., garantindo um triunfo depois de aplacar uma revolta dos aquitanos.[18]
Pouco antes ou imediatamente depois de seu mandato na Aquitânia, Corvino foi prefeito da Ásia Menor,[19] nomeado pelo Senado, provavelmente em 30 a.C., para saudar Augusto com o título de "pater patria". O início de seu discurso para a ocasião foi preservado por Suetônio.[20]
Durante os distúrbios nas eleições, em 27 a.C., Augusto nomeou Corvino para o cargo de prefeito de Roma, mas ele renunciou seis dias depois, pois considerava que suas funções eram inconstitucionais.[21] Pode ter sido nesta ocasião que Corvino proferiu sua frase mais famosa, "Estou desgostoso com o poder".[22]
Família
editarEra filho de Marco Valério Messala Níger, cônsul em 61 a.C.[23] com sua esposa Pola. Alguns autores disputam esta informação e alegam que outro descendente de Marco Valério Corvo, como Marco Valério Messala Rufo, cônsul em 53 a.C., seria seu pai.[24] Segundo Eusébio de Cesareia, nasceu em 59 a.C., o mesmo ano de nascimento de Lívio.[25] Apesar disto, como Messala já acumulara uma reputação por sua eloquência antes do início da guerra civil posterior à morte de César (43 a.C.), a data de seu nascimento, por volta de 70 a.C., parece ser mais correta.[26] Corvino casou-se duas vezes. Sua primeira esposa foi Calpúrnia, possivelmente uma filha de Marco Calpúrnio Bíbulo, cônsul em 59 a.C., com quem teve três filhas. A primeira filha, chamada Valéria Messalina, foi casada com o senador romano Tito Estacílio Tauro, filho de Tito Estacílio Tauro, cônsul em 36 e 27 a.C.. A segunda, também chamada Valéria, casou-se com o senador Marco Lólio,[27] um aliado de Augusto. Seu filho mais velho, Marco Valério Messala Messalino, foi cônsul em 3 a.C..
Acredita-se que seu filho mais novo, Marco Aurélio Cota Messalino, cônsul em 20 d.C., tenha nascido de uma segunda esposa, de nome desconhecido, principalmente por causa do intervalo de tempo entre o consulado dos dois filhos.[23] As obras do poeta Ovídio[28] revelam que a segunda esposa de Corvino era uma mulher chamada Aurélia Cota, cuja existência é suportada pelo fato de que o suposto filho dos dois adotou o nome de família (Aurélio Cota) dela.[29]
Valéria, uma parente, talvez sua irmã, casou-se com Quinto Pédio, cônsul em 43 a.C,[30] um primo pelo lado materno do imperador Augusto. Os dois tiveram um único filho, Quinto Pédio Publícola, que foi um grande orador. O filho dele, por sua vez, foi o famoso pintor surdo Quinto Pédio, que foi criado por Corvino, que era seu tio-avô.
Influência
editarPatrocínio e obras
editarSua influência sobre a literatura romana, que encorajou especialmente Caio Mecenas, foi considerável e um grupo de expoentes da época que se juntou à sua volta, incluindo Tíbulo, Ligdamo e a poeta Sulpícia, foi chamado de "Círculo de Messala". Corvino era amigo íntimo de Horácio e Tíbulo enquanto Ovídio expressa abertamente sua gratidão como o primeiro a ter notado e encorajado seu trabalho. Os dois panegíricos de autores desconhecidos (um deles incluído entre os poemas de Tíbulo no capítulo IV e o outro, no "Catalepton", a coleção de poemas curtos atribuída a Virgílio) revelam a alta estima devida a ele por seus seguidores.
Corvino foi também o autor de numerosas obras, todas perdidas. Entre elas estavam suas memórias das guerras civis depois da morte de César, utilizadas por Suetônio e Plutarco, poemas bucólicos em grego, traduções de discursos gregos, ocasionais versos e poemas eróticos e ensaios sobre as minúcias da gramática latina. Como orador, era seguidor de Cícero contra a escola Ática, mas seu estilo era afetado e artificial. Críticos posteriores, porém, o consideraram superior a Cícero e Tibério o adotou como modelo. No final da vida, escreveu uma obra sobre as grandes famílias romanas, incorretamente identificada com o poema ainda existente chamado "De progenie Augusti Caesaris", que é atribuído a ele, mas é, na verdade, uma obra do século XII.
Locais associados a Corvino
editarCorvino tinha uma casa no monte Palatino, a mesma que fora de Marco Antônio, presenteada a ele e a Marco Vipsânio Agripa por Augusto.[31] Uma inscrição[32] revela Corvino como proprietário dos famosos Jardins de Lúculo (em latim: "Horti Luculliani"), no monte Píncio, onde hoje estão os jardins da Villa Borghese.
O Casal Rotondo, um túmulo cilíndrico perto do sexto marco miliário da via Ápia, é geralmente identificado como sendo o túmulo de Corvino, o que é discutido nas fontes[a]. Corvino também aparece numa inscrição como sendo um dos três amigos de Caio Céstio responsáveis por erigir as estátuas que antigamente adornavam a famosa Pirâmide de Céstio, perto da Porta San Paolo, em Roma.
Ancestral lendário da realeza húngara
editarA família húngaro-valáquia de João Corvino (da família dos "Hunyadi") e seu filho, Matias Corvino, rei da Hungria e da Boêmia, alega ser descendente de Corvino. Esta tese baseia no fato de que o próprio Corvino teria sido um grande proprietário de terras nas fronteiras da Panônia e Dácia, o futuro território da Hungria e parte da Romênia, e que seus descendentes continuaram a viver na região pelos 1400 anos seguintes, sendo os "Hunyadi" os descendentes finais da família de Corvino — uma afirmação sem nenhuma base histórica ou documental. A ligação parece ter sido feita pelo biógrafo de Matias, o italiano Antonio Bonfini, profundo conhecedor dos autores clássicos latinos.
Bonfini também deu aos "Hunyadi" o epíteto de "Corvinus", que teria sido dado ao tribuno da plebe Marco Valério Corvo em 349 a.C. quando, no campo de batalha, ele aceitou o desafio para um combate singular proferido por um bárbaro de grande força e Estacura. Repentinamente, um corvo teria levantado voo de um tronco, pousado sobre seu elmo e começado a atacar os olhos de seu adversário com tamanha ferocidade que o bárbaro foi cegado e Corvo teria conseguido vencê-lo com facilidade. Como recordação deste evento foi criado o agnome "Corvino" na gente Valéria. Os "Hunyadi" chamavam a si próprios de "Corvinos" e suas moedas foram cunhadas com o símbolo do "corvo com um anel", um símbolo que depois foi aproveitado como brasão das famílias aristocráticas da Polônia aparentadas. Outra consequência é que o triunfo de Marco Valério Messala Corvino sobre os aquitanos é celebrado ainda hoje sobre o frontão do Palácio Krasiński, em Varsóvia.
Ver também
editarCônsul da República Romana | ||
Precedido por: Lúcio Cornélio Cina (suf.) com Marco Valério Messala (suf.) |
Marco Antônio III (oriente) 31 a.C. com Otaviano III |
Sucedido por: Otaviano IV |
Notas
editar- ↑ O escavador original, Luigi Canina, deduziu este fato a partir de um fragmento de uma inscrição com o nome "Cotta" que o monumento teria sido construído por Marco Aurélio Cota Messalino para seu pai, mas atualmente assume-se que esta inscrição e outros fragmentos arquiteturais são originários de um monumento menor no menos local e que nada tem a ver com Corvino.[33]
Referências
- ↑ Charles Anthon, A Classical Dictionary (Harper, 1848), p. 1370.
- ↑ Cícero, Epistulae ad Atticum XII 32
- ↑ Horácio, Sátiras, I 10 81-86; Apiano, De bellis civilibus IV 38; Plutarco, Vidas Paralelas, Bruto 24
- ↑ Cícero, Epistulae ad Atticum XV 17
- ↑ Tácito, Anais IV 34; Dião Cássio, História Romana XLVII 24; Plutarco, Vidas Paralelas, Brutus 40; Veleio Patérculo, História Romana II 71
- ↑ Apiano, De bellis civilibus IV 38; Cícero, Epistulae ad Atticum XVI 16
- ↑ Veleio Patérculo, Libro ii. 71
- ↑ Plutarco, Vidas Paralelas, Bruto 41.
- ↑ Apiano, De bellis civilibus IV 38
- ↑ Broughton, II p. 380
- ↑ Apiano, De bellis civilibus V 102-103, 110-113
- ↑ Broughton, II p. 402
- ↑ Broughton, II p. 405
- ↑ Dião Cássio, História Romana XLIX 38; Apiano, De rebus Illyricis 17; Estrabão, Geografia IV p. 189
- ↑ Broughton, II p. 411
- ↑ Plutarco, Vidas Paralelas, Brutus 53.
- ↑ Dião Cássio, História Romana LI 7
- ↑ Dião Cássio, História Romana LIII 12; Apiano, De bellis civilibus IV 38; Tibulo, Elegias I 7, II 1.33, II 5 117, IV 1, IV 8. 5
- ↑ Tíbulo, Elegias I 3
- ↑ Suetônio, As Vidas dos Doze Césares, Augusto 58; Floro, Epítome da História de Lívio OV 12. § 66; Ovídio, Fastos II 127; Tristia II 39, 181; Dião Cássio, História Romana LVI 8, 41
- ↑ Tácito, Anais VI 11; Dião Cássio, História Romana LVI 6
- ↑ J.P. Sullivan (ed), Apocolocyntosis (Penguin, 1986) note 44. ISBN 978-0-14-044489-6
- ↑ a b Syme, R., Augustan Aristocracy, p. 230 f.
- ↑ Syme, R., Augustan Aristocracy, pp. 230 f.
- ↑ Eusébio de Cesareia, Contra Hieroclem em Cron. Olymp. 180. 2.
- ↑ Ellendt, Proleg. Ad Cic. Brut. p. 131, comp. Clinton, F. H. vol. iii. p. 183, 59 a. C.
- ↑ Genealogy of M. Lollius by D.C. O’Driscoll
- ↑ Ovídio, EIV.XVI:1-52
- ↑ Skidmore, Practical Ethics for Roman Gentlemen: The Works of Valerius Maximus, p.116
- ↑ Syme, R., Augustan Aristocracy, p. 20 e 206.
- ↑ Dião Cássio, História Romana 53.27.5
- ↑ CIL VI, 29789 = ILS 5990
- ↑ L. Grifi, "Sopra la iscrizione antica dell auriga scirto", Diss. del. Acc. Rom., Rome 1855, p.491ff. [1]; M. Marcelli, "IV MIGLIO, 14. Casal Rotondo", in: Susanna Le Pera Buranelli & Rita Turchetti, edd., Sulla Via Appia da Roma a Brindisi: le fotografie di Thomas Ashby: 1891–1925, Rome: L'Erma di Bretschneider, 2003, p.77
Bibliografia
editar- Broughton, T. Robert S., The Magistrates of the Roman Republic, Vol II (1952)
- Syme, Ronald, "The Augustan Aristocracy" (1986). Clarendon Press. Retrieved 2012-11-06 – via Questia (inscrição necessária)
- Eva Cantarella, «Messalla, Ovidio e il circolo dei poeti», Corriere della Sera, 13 de janeiro de 2013 (em italiano)